19.11.04

porque hoje...




Este difícil mês de Novembro.
Cor baça, enevoada, embora o sol tenha rompido a gaze lançada sobre as imagens.

Lembro outros. Mas não me lembro se eram enevoados. Eram apenas presentes, mesmo quando as palavras não se encontravam, as minhas e as tuas, na difícil comunicação que sempre mantinhamos. Era antigo o nosso desacordo, vinha de longe, misturava a necessidade de violentar o afecto, teimosamente sofrido, que nos ligava mais do que as feridas que o meu crescimento ia acumulando.

Invariavelmente repetias, é um dia igual aos outros, mas não era e tu sentias. Escondias a tristeza se o Zé, por distracção corrigida ao fim do dia, não se apressava a telefonar. E irritavas-te com a mãe se ela o referia. Era sempre o tempo, a falta de tempo, não percebes? Mas o sorriso desenhava-se quando o telefone tocava.

Aparecia-te manhã cedo, com um beijo embrulhado, escondido atrás de palavras rápidas com receio que se colassem ao hábito, mas recolhidas por ti com a intensidade do teu amor paternal. E acordávamos nessa paz, nesse dia. Como se os outros se sentissem perturbados pelas tréguas. E depois, lá voltávamos aquela luta de afectos tão cuidadosamente mantida.

Não levei flores para enfeitar a tua ausência. Não é preciso. O que guardo dentro de mim foi por ti estruturado ao longo dos anos.

Neste difícil e enevoado mês de Novembro.
Porque hoje farias anos.

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