11.4.06

leituras

Era Martine Villandreux. De voz acetinada pela fadiga. De cigarro entalado entre as unhas pintadas. Uma franja indefinida abrindo-se em leque sobre a testa. A alça do vestido preto descaída sobre o ombro arredondado. Era incrivelmente perturbadora. Sem dúvida, a mulher mais sensual que me fora dado conhecer. Impregnada de cansaço, lindamente marcada pelas rugas, e confortada com alguns quilos a mais, Martine Villandreux eclipsava a inocente perfeição da filha, vinte e cinco anos mais nova. Aquela mulher libertava uma força erótica tão perceptível, tão forte quanto o odor da relva acabada de cortar. Naquela noite instável do primeiro dia do ano, eu só desejava uma coisa: que o pai levasse a filha, que partissem juntos e me deixassem sozinho com a mãe. Então, esperaria que ela fumasse o cigarro até ao fim. Na sua boca, provaria o gosto do tabaco húmido. E não haveria grande coisa a dizer. Ela afastar-se-ia de mim, iria até à casa de banho e deixaria a porta aberta. Despiria as cuecas, sentar-se-ia na sanita e deixaria correr um fio de urina. Ao ouvir o leve ruído daquela cascata, eu fecharia os olhos. Com a humildade do peregrino, ajoelhar-me-ia no chão. Introduziria o braço dobrado no meio das suas pernas. Assim aprisionada, com o punho fechado na sua cintura de fêmea, as coisas decorreriam com maior fluidez. As línguas penetrariam em todos os orifícios da terra, lambendo o que pode ser lambido. Não existiria nem diante, nem detrás, nem frente, nem perfil. As bocas encher-se-iam, e também os ventres, e as mãos, e ainda o peito. Sob a pressão dos corpos, as peles retesar-se-iam, esticar-se-iam, retorcer-se-iam, semelhantes a gárgulas pagãs e líquidos de toda a espécie exsudariam ao longo das paredes internas. As palavra serviriam de ajuda, segredadas ao ouvido, sibilinas. (...) E então pairaria no ar a irradiação sacrílega, o sentimento de não trair em vão. Em seguida, tornar-se-ia impossível estabelecer diferenças entre as posturas dos homens e as dos cães. Deste encontro entre corpos elevar-se-iam os odores marinhos da vida. Salpicos de esperma lubrificariam os últimos orifícios. Os dentes morderiam a pele. Ele enterraria a arma até ao fundo, escavando a sua própria sepultura e ela conduzi-lo-ia às portas da perdição.

Jean-Paul Dubois, Uma Vida Francesa


É aqui que vou, neste espantoso momento descritivo. E aqui parei, Jean-Paul...

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