Por entre a névoa de sofrimento, apercebi-te em sfumato, separado já do azul definido da primeira vez, delineando a dolcezza do sorriso que te acompanhou. No burburinho asséptico de corredores e batas brancas, o meu olhar movia-se no vácuo da dormência que sucede ao inelutável, sem capacidade ainda de reacção ou de percepção outra que não englobasse a perda e esta estendia-se como um deserto apenas povoado pela ausência. Percebera que o acto de nascer nos coloca absolutamente solitários face à vida e a árvore ou a parede acolhedora de quase uma existência, não fizeram mais que iludir esse estado. Debruçada na estranheza da descoberta, as palavras soltaram-se-me inóquas, cuidadosamente alinhadas e seguiram paralelas à tua presença atenta, que me ouvia. Vejo-te ainda, balançando o olhar entre a conversa que detinhas e o som dos meus passos, até tomar por inteiro o meu sentido. E assentiste. De todas as tarefas e cuidados a que tinhas de responder o que eu te solicitava era menor, mas assentiste e nunca te expliquei que essa gota de generosidade, naquele momento, significou tanto! Nunca te agradeci. Subitamente, dei-me conta; há 10 anos foi apenas ontem.
(...) o teu lugar
permanecerá sempre no côncavo do sonho
onde eu não me esquecerei
de agora ou logo ir-te lá buscar (Ruy Belo).
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