7.8.04

O pátio dos limoeiros


[Haggenmacher, Limon ]

Não sei porque plantaram limoeiros. Talvez a intimidade dos pátios, agasalhados pelos muros das casas, lembrassem velhos jardins árabes de árvores odoríferas. É estranho olhar os espaços onde outrora o campo se cobria de figueiras, vinha e amendoeiras, rasgado nas suas entranhas para aí se implantar a "aldeia árabe" que hoje compõe o aldeamento. Liderada pela velha casa de alpendre, sobre a baía, os campos enfeitavam-se apenas de ervas rasteiras, umas aromáticas, como o funcho e o poejo ou, as floridas, de amarelo e branco, balançando as cores entre extensões de erva azedinha as campânulas esmorecendo em seiva agridoce que sugávamos com agrado.
Mas então, os caminhos eram outros e a distância não se percorria facilmente, percorria-se com o gosto de chegarmos a um paraíso perdido. O carro chegava apenas aos Arcos e aí permanecia até ao final das férias. A partir desse momento todo o percurso era uma aventura. A terra arenosa enchia o carreiro estreito, rasgado fundo no campo como se o mar tentasse penetrar a terra e espreitar quem chegava. A distância era longa e o burro, veículo único no caminho magro entre estrada e praia e tão habituado a carregos, levava as malas. Nas hortas que bordejavam para lá das sebes, soava a cadência fresca dos alcatruzes das noras, transportando no ar a dança que a água produzia. Algumas velhas casas ainda permanecem como testemunhos. Cortávamos o campo em filia indiana com incitamentos cantados alegremente, sobretudo quando passávamos a Alcaria, tão próxima já da praia, e o percurso completava-se ao ritmo dolente do burrico.
O pátio arranjado a um canto junto ao muro das casas onde o marmeleiro e a romanzeira debruçam os ramos sobre o longo banco de alvenaria enquadra o caminho breve para o pátio superior. Acompanhando a elevação do terreno, dois grandes limoeiros espreitam do alto dos degraus, acolhendo-me com a sua sombra e o seu perfume. Ao caminhar, os pés tropeçam nos frutos caídos, o odor forte enche-me as mãos e envolve a manhã clara.

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