23.9.04

edifícios citadinos


(anonymous, La Piazza delle Erbe di Verona)

Architecture (...) We may live without her, and worship without her, but we cannot remember without her.
John Ruskin

Os passeios são estreitos, na Rua da Junqueira. Casas contidas pelos muros seculares, esquadrias bem traçadas, janelas olhando o rio ou espreitando os passos de quem segue. São muitas as memórias ribeirinhas, acolhidas na proximidade do Tejo, desenhadas em velhas construções de paços, casas senhoriais e habitações de veraneio.
De há muito, são longas as conversas entre o meu olhar e as casas alinhadas, correndo a rua, em janelas de cantaria rasgadas na superfície murária, brilho de azulejaria separando espaços, enquadrando as aberturas. Algumas, conservam ainda os lintéis marcados por rosetas esmorecendo em lágrima nas prumadas laterais. Há uma que namoro longamente, percebendo épocas diversas e evoluções de passagem de século. Baixa, de dois pisos, guarda o cunho dos velhos mestres do Infantado, embora maltratada, em desvios de riscos severos, pombalinos. No piso superior, janelas de sacada, guarnecidas por belos gradeamentos de gosto francês, demarcam a sua posição de privilégio. Despontando na beira magra do telhado, ainda visível, um outro piso foi acrescentado, não mantendo já a traça inicial.
Posso seguir os acrescentos, as evoluções na construção, mas não detecto vestígios de quem as habitou. Não as descobre o olhar. E quedo-me, em interrogações sobre esses passados, essas vivências esquecidas que as paredes não guardaram e o exterior excluiu. Na impossível permanência de pessoas, de viveres e, sobretudo, de pedras desavindas em alçados transformados em mantas de retalhos.
E ao passar, na Rua da Junqueira, os passeios estreitam mais a descoberta.

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